Lições da Convenção da NRF 2014

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NRF 2014A pedido da Revista Gôndola, da AMIS-Associação Mineira de Supermercados, escrevi o artigo abaixo, um apanhado dos principais pontos discutidos esse ano na principal convenção de varejo do mundo. Saiu na edição número 217 da revista.

Boa leitura.

 

Lições da Convenção da NRF 2014

Maurício Morgado

O Retail´s BIG Show 2014 da NRF mais uma vez bateu recordes: foram mais de 30.000 participantes do mundo todo e o Brasil, como já vem acontecendo há muitos anos, foi o país que mais mandou representantes – tivemos mais de 1.700 brasileiros por lá agora em janeiro. Esse ano pudemos trazer 8 grandes lições para o Brasil.

1.     Inovação

Na convenção da NRF todos os anos são apresentados conceitos de loja diferenciados. Esse ano, entretanto, se falou muito de produtos diferenciados também. Afinal, na maioria das vezes é isso que as lojas vendem: produtos. Cada vez mais os designers e engenheiros procuram inventar e construir experiências marcantes, quer seja em produtos, quer seja em serviços. Mas o que é marcante? Algo que seja suficientemente motivador para fazer o consumidor ter vontade de compartilhar, contar para os amigos.

Esses novos produtos e serviços que têm surgido, segundo a consultoria Mintel, devem atender a três requisitos. Primeiramente devem ser customizáveis, como o MyMusli, um site fundado por três jovens alemães onde o consumidor pode escolher a “fórmula” para preparação do seu muesli e receber o produto personalizado em casa ou o sutiã Jockey Bra, onde a consumidora, a partir de 18 moldes diferentes, obtém o modelo que mais se adéqua a se seu corpo. Em segundo lugar, os produtos de sucesso hoje é dia devem funcionar como uma segunda pele, ampliando os cinco sentidos ou interagindo com eles. Um bom exemplo de produtos nessa categoria é o Google Glass, ou o “relógio” Samsung Galaxy Gear, ambos integrados ao mundo wireless que vivemos. Finalmente, a terceira característica dos produtos de sucesso hoje é dia é a capacidade de atenderem aos “transumers“, consumidores sempre em trânsito, viajando e se deslocando com frequência. O Yotel, um hotel para descanso breve em aeroportos é um bom exemplo disso, com seus quartos minúsculos e cheios de tecnologia. No lado do varejo, o Smak Parlour, inspirado nas vans e caminhões de alimentação (os food trucks) é um bom exemplo. Com provador, exposição de produtos interessante e, claro, um caixa para pagamento, o caminhão vai até o local que o consumidor está.

Duas tendências que foram apontadas e para as quais devemos ficar atentos são o uso intensivo dos smartphones (mais ou menos metade dos celulares do mundo já está nesse padrão) e, novidade do ano, a diminuição do uso e do interesse pelos automóveis por parte dos jovens. Para poupar tempo esses consumidores procuram morar nos centros urbanos, evitando deslocamentos de casa para o trabalho. Para inovar é preciso ficar atento às tendências e desenvolver produtos e serviços que as atendam de maneira profunda e significativa.

2.     Omnichannel

Está cada vez mais difícil a separação entre a loja física e o ambiente virtual. O consumidor quer uma experiência com a marca do varejista integrada, “sem costuras aparentes” como dizem os norte-americanos. O cliente não diferencia se a compra é online, no quiosque, no celular ou na loja física. A interação que ele tem é com a marca do vendedor, não importa por qual canal esteja comprando.

Mas falar de omnichannel sem lembrar da Amazon é quase impossível. Segundo Scot Wingo, da ChannelAdvisor, a gigante do mundo virtual já está com receitas de US$ 120 bilhões por ano (para referência, o Walmart está perto US$ 500 bilhões). A novidade é que esses US$ 120 bilhões podem representar um impacto muito maior nas vendas do varejo como um todo: de um quarto a um terço desse faturamento vem de vendas de parceiros da Amazon para os quais ela cobra 10% de comissão, funcionando como marketplace para eles. Oras, se 1/3 do faturamento da Amazon vem de 10% de comissões que ela cobrou, as vendas totais foram muito maiores, na casa dos US$ 480 bilhões, já se aproximando do Walmart. Assustador, não?

Outro ponto que chama muita atenção é um um outro dado fornecido pela ChannelAdvisor: em 2010, 43% das pessoas iniciavam suas compras online pelo Google e 11% pela Amazon. Em 2011 essa relação se inverteu e em 2012 53% das pessoas afirmaram iniciar suas compras pela Amazon. Ou seja, falou em comprar pela Internet, a Amazon é top of mind. E é por aí que a compra começa.

Ah, para completar as notícias assustadoras, o Facebook está se tornando coisa de tiozinho. Na Inglaterra ele já estaria “morto e sepultado” entre os adolescentes de 16 a 18 anos). Conforme os mais velhos aderem à rede social, esses jovens migram para Twitter, Instagram, WhatsApp e Snapchat, segundo o University College London, Nos Estados Unidos a rede de Mark Zuckerberg perdeu 3 milhões de adolescentes entre 2011 e 2014. Está na hora de reavaliar sua mídia digital.

3.     Informação, informação, informação

A apresentação da presidente da IBM, Virginia M. Rometty, foi um show a parte. Ela chamou a atenção pela vibração com que conduziu sua palestra e pelas ótimas novidades que compartilhou. Segundo ela, os novos sistemas de informática em desenvolvimento não vão apenas contar, descrever e predizer dados, como o tempo estimado de chegada em um destino que o Waze atualmente nos fornece, por exemplo. Nessa nova era, a dos sistemas cognitivos, eles serão capazes de interagir conosco em linguagem natural, aprender com essas interações e PRESCREVER soluções. No caso apresentado por ela, o consumidor simplesmente informa ao sistema que fará uma caminhada nas montanhas de determinada região. A partir dessa informação o sistema sugere os equipamentos e produtos mais adequados para a jornada.

Nesse mundo hiper tecnológico, é fundamental que olhemos para dentro de casa e perguntemos se nossas empresas acumulam e analisam os dados dos clientes, interagindo com eles com base nesses dados ou se simplesmente somos geradores de SPAM.

4.     Comunidade

Esse ano muito se falou sobre o papel que o varejo tem perante a sociedade. Casos como o da TOMS Tomorrow’s shoes, com sua política de one for one, onde cada sapato vendido gera uma doação de outro para uma criança necessitada foram muito valorizadas. Mas, para o varejo, a atenção para a comunidade parece fazer muito mais sentido quando consideramos a área de influência da loja. É desse entorno que a maioria dos negócios dos varejistas físicos costuma vir e é para essa comunidade que a loja deve se voltar e servir.

Pensando na comunidade física do entorno da loja, a palestra de Rick Caruso, da Caruso Affiliated, chamou muita atenção. Desenvolvedor de shopping centers que procuram se assemelhar com centros de comércio tradicionais, Caruso defendeu que as ruas sempre foram os principais locais para instalação de comércio no mundo, citando Paris e Roma como exemplos. Considerando que as compras podem ser vistas como oportunidade para conexão social, o espaço das lojas pode muito bem oferecer esse senso de pertencimento a uma comunidade. Além disso, Caruso ponderou que, por mais conveniente que seja a compra online, ela sempre dá muito trabalho para pesquisar e selecionar os produtos de interesse, enquanto que na loja física a oferta de produtos já está “editada” para o cliente, ou seja, uma pré-seleção já foi feita. Essa seria a grande vantagem das lojas físicas sobre o varejo online.

5.     Liderança

O papel da liderança sempre é abordado na convenção da NRF e dessa vez não foi diferente. O principal líder a discursar no evento foi George Bush. Nem sempre amado por todos devido à sua polêmica “doutrina Bush”, é inegável que o ex-presidente deixou algumas lições para os líderes empresariais presentes. De maneira resumida, esses seriam seus conselhos:

  • Nos momentos de crise, o líder deve manter a calma e projetar essa sensação para os liderados;
  • O líder deve passar a mensagem de que tomará conta do problema gerador da crise;
  • Ter estratégia e visão sempre, estando ou não em crise;
  • Fazer diplomacia pessoal para conseguir seus objetivos;
  • Cercar-se de pessoas que sabem o que você não sabe (e confiar nelas, levá-las a sério);
  • Ter pessoas que estejam confortáveis nos seus postos, pessoas certas no lugar certo;
  • Mensurar e ter responsabilidades claras para cada pessoa (accountability, no inglês).

6.     Venda direta de fabricantes

As lojas de fabricantes continuam chamando a atenção. Além das já conhecidas lojas da Apple, Nike, Sony, Adidas, Melissa, Converse, M&M, a grande novidade desse ano foi a nova loja da Samsung no Soho. Com a desculpa de oferecer café e cupcakes de graça, o cliente interage com os produtos da marca, incluindo computadores, celulares, televisores e o mais novo lançamento da empresa, o Galaxy Gear. Tudo isso num ambiente muito gostoso e informal. Não chega a ter o movimento que a loja da Apple a duas quadras acima tem, mas é muito interessante.

7.     Experiência de compra

Perdemos a conta do número de vezes que se falou sobre experiência de compra na convenção da NRF desse ano. Como o tema já é de conhecimento amplo, vale a pena exemplificá-lo  com uma das grandes novidades em termos de conceito de loja que recentemente surgiram no varejo norte-americano, a Story. A loja troca toda a sua linha de mercadorias a cada dois meses (!), sempre orientando os novos produtos por uma temática específica. Já trabalharam, por exemplo, com os temas “Love”, “Design”, “New York City” e “Made in America” entre outros. Escolhido o tema, a proprietária, Rachel Shechtman, e sua equipe partem em busca de designers com produtos ligados à temática escolhida. O conceito da loja, pela definição da própria marca, é: “adotar o ponto de vista de uma revista, mudar como uma galeria e vender coisas como uma loja”. Dá para imaginar uma loja que muda TUDO a cada dois meses?

8.     Posicionamento claro e diferenciado

Lição que se repete nas convenções de todos os anos, a necessidade de ter um posicionamento claro e diferenciado é fundamental. Conceituar a marca na cabeça do cliente é a chave para ser relevante na vida dessas pessoas e, convenhamos, os norte-americanos sabem fazer isso muito bem. Um caso que chamou a atenção esse ano foi o da Life is Good. Fundada por dois irmãos, Bert e John Jacobs em 1994, a rede hoje já fatura cerca de US$ 100 milhões por ano e tem mais de 200 empregados. Inicialmente a empresa vendia somente camisetas com mensagens otimistas (daí o nome Life is Good). Hoje já oferece uma linha completa de vestuário para adultos e crianças com mais de 900 itens. Seu posicionamento é claro: a vida é boa, com otimismo a toda prova. Isso está presente no visual da loja, nos produtos oferecidos, no tipo de atendimento que é oferecido e na mentalidade dos fundadores.

É fundamental, antes de tudo, saber o conceito que a loja trabalhará no mercado. Caso isso não esteja claro para você, não estará para seus funcionários e, sem dúvida, seus clientes também não perceberão sua proposta. Por isso, deixamos aqui quatro perguntas que você deve responder para se assegurar que seu posicionamento está claro. Se não conseguir respondê-las a contento, sua empresa tem um problema:

  • Qual a razão de existir da sua loja?
  • O que ela veio fazer no mundo?
  • Se sua loja morrer, qual será o seu epitáfio?
  • Quem vai sentir falta dela?

Caso você tenha uma empresa pequena, use a técnica Menudo: Não se reprima! Pense como empresa grande, procure ser o  “rei do pedaço”, o líder na sua região, ou mesmo área de influência.

Bons negócios em 2014!

Para ver o artigo no site da revista ou para baixar um pdf da revista toda, clique no link abaixo:

http://www.youblisher.com/p/814743-Revista-Gondola-Edicao-217/

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0 resposta

  1. A sua matéria é muito interessante, entendo até porque os jovens migram para outras formas de comunicação, quando os “tiozinhos” começam a usar a que estão se relacionando (jovens ñ tem paciência com os mais velhos ), para os jovens tudo tem que ser rápido, reflexo puro da atualidade, os muito lentos ficarão para escanteio.
    E as 4 perguntas que você elaborou no item 8, podem também serem feitas adequadamente em nossas vidas.
    Desejo-lhe sucesso.

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